quarta-feira, 28 de setembro de 2016

#omeuanoemfotos 271 | Pérolas

É do conhecimento público que apelido carinhosamente de "pérolas" os meus alunos, porque conseguem fazer perguntas ou comentários dignos do meu registo (tendencialmente irónico) tal não é a criatividade. Mas acima de tudo porque uma pérola é uma preciosidade e é esta a importância que lhes dou. Cada um com o seu feitio, cada um com o seu ritmo, cada um com as suas competências; todos diferentes, todos preciosos. Por vezes, perguntam-me quantos filhos tenho e normalmente respondo: "uma em casa e cerca de duzentos fora".
Não, não sou mãe deles, nem pretendo ser. Porém, somos nós, professores e formadores, que passamos grande parte do dia com eles, numa fase em que procuram e escolhem os tijolos que vão construir a sua personalidade e o seu caminho. E isto acontece numa fase muitas vezes decisiva para o futuro que os aguarda. Temos, por isso, um papel importante nas suas vidas: a paixão com que partilhamos conhecimento, um gesto, um comentário inofensivo, um qualquer comportamento da nossa parte pode mudar uma trajetória, por vezes sem darmos conta. Somos os verdadeiros profissionais do oculto: sem reconhecimento ou valorização, somos aqueles que desenham percursos de vida, como se estes surgissem por chamamento divino.
Por tudo isto, devemos ser os primeiros a reconhecer a importância desta profissão e não o fazemos quando a reduzimos exclusivamente ao cumprimento de um horário de entrada e saída, em que pelo meio despejamos conteúdos e programas, para em seguida avaliarmos quantitativamente. Sem dúvida, é mais fácil; sem dúvida, é o que o "sistema" merece quando nos inunda de burocracia e nos desvaloriza; sem dúvida, é o que nos apetece frequentemente fazer. Ceder  a tudo isto é perder e não deveríamos gostar de perder.
Há mais de 10 anos atrás, numa das minhas primeiras reuniões de professores, decidi apresentar uma proposta para uma atividade que, na altura, considerei dinâmica, diferente, inovadora. Lembro-me de uma colega, já com muitos anos desta vida, soltar um riso irónico e comentar: "isso é tudo muito bonito...vocês, jovens professores, cheios de ideias e vontade...daqui a uns tempos vão perceber que mais vale estarem sossegados". Nunca mais esqueci este comentário e recordo-o com alguma frequência, pela desilusão que vi naquela colega e pelo medo de pensar que ela pudesse ter razão. Não sei se terá, pois continuo a mesma "idiota" desse tempo, mas ainda há muita estrada para percorrer. Para já, baixar a guarda perante o sistema está fora de questão. [culpem/agradeçam ao meu sagitário...]

E é por esta e por outras que hoje fui parar a um campo de futebol com as minhas pérolas mais preciosas, a torrar ao sol, a transpirar como se corresse o campo de um lado ao outro o tempo todo (o que não corresponde exatamente à realidade...), a ser ignorada pela minha falta de talento futebolístico, a levar com gritos quando por acaso a bola me aparecia à frente. Durante algumas horas, fui avaliada e as minhas (in)competências ficaram expostas. Nenhum deles desistiu de mim, ainda que alguns tenham tido essa vontade algumas vezes.
Por que haveria eu de desistir deles?!

 

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